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quarta-feira, 3 de março de 2010

Você sabia que o primeiro carro flexível não é brasileiro?

Hoje o motor flex etanol/gasolina responde por cerca de 90% das vendas de automóveis e
comerciais leves.


(22-12-09) – Se o Brasil foi pioneiro no etanol, não conseguiu a primazia em motores flexíveis. Estrearam aqui no VW Gol em 2003, 12 anos depois dos EUA. Mas há ressalvas. Em 1995, a Bosch propôs a solução flex aos fabricantes nacionais, que o ignoraram. Na realidade, foi a substituição do caro e impreciso sensor de combustível no tanque pelo uso da sonda lambda, já existente em todos os motores com injeção de combustível, que viabilizou tecnicamente o produto. Até hoje, o autor da descoberta é desconhecido, embora vários defendam a paternidade.

Hoje o motor flex etanol/gasolina responde por cerca de 90% das vendas de automóveis e comerciais leves. O desenvolvimento, porém, tem sido lento e mais voltado a privilegiar a gasolina do que o etanol por razões comerciais equivocadas. Isso apesar de, em dois terços de onde se concentra a frota nacional, o etanol apresentar boa economia no custo/km, sem contar as incontestáveis vantagens ambientais. Depois de seis anos, alguns fabricantes deram passos adiante de outros, em especial quanto à taxa de compressão, mas ainda ficam devendo. Em parte porque a indústria precisava se capitalizar, depois de um período de prejuízos financeiros no mercado interno (1997/2003).

De qualquer forma, na atualidade, dispomos dos melhores motores flex do mundo. No entanto, permanecemos longe de aproveitar as novas tecnologias que surgem no exterior para ciclo Otto porque, de fato, são caras no estágio presente. Consola apenas saber que turbocompressor e injeção direta, entre outros avanços, um dia deverão aportar por aqui. Para os flexíveis trata-se de solução sob medida. Proporcionará um salto olímpico em termos de rebaixar consumo e emissões, além de aumentar torque e potência, particularmente ao se utilizar o combustível renovável.

Falsos dilemas

Em alguns casos, o Brasil chega atrasado ao tratar de assuntos ambientais relacionados a veículos. Enquanto o mundo foca a atenção para emissões de CO2, o ministério do Meio Ambiente (MMA) cria a extemporânea Nota Verde para os poluentes que estão sob controle (CO, HC e NOx), no caso de motores do ciclo Otto, pois não se vendem automóveis a diesel no País. Motores flex, mesmo no atual estágio, encontram-se bem abaixo do que exige a lei brasileira quanto a emissões tóxicas, tanto com etanol como gasolina, gerando falsas comparações entre os dois combustíveis.

Nações evoluídas não se preocupam em montar ranking de toxidade, pois a indústria sempre cumpriu os limites estabelecidos. Apertam as regulamentações e ponto final. Lá fora, a preocupação é a frota antiga, com mais de quatro anos de idade. No Brasil, ao contrário, perde-se tempo e dinheiro ao se inspecionarem carros seminovos, estatisticamente irrelevantes ao meio ambiente.

Outro dilema sem nexo ocorre com discussões sobre E85 (85% de etanol anidro e 15% de gasolina) usado no exterior. A opção nacional pelo E100 (etanol hidratado), desde 1975, trouxe benefícios em termos de preço, logística, emissões e desempenho do motor. O consumo ligeiramente menor de E85 não compensaria. Essa mistura exigiria um aparato de fiscalização a fim de evitar, clandestinamente, o E90 ou E95. A tentação dos fraudadores seria grande. Deixariam de adicionar gasolina (mais cara) ao etanol e os motores poderiam se negar a partir no inverno.

Bosch, Delphi e Magneti Marelli já desenvolveram o sistema de partida a frio, sem gasolina, para motores flex. O pré-aquecimento do etanol por circuito elétrico, quando necessário, traria melhorias substanciais em dirigibilidade, praticidade e principalmente emissões (até 40% menos), na fase fria de funcionamento do motor. A diferença de custo, se houver, seria muito pequena frente aos ganhos, além de aposentar o jurássico tanquinho auxiliar.

Fabricantes de veículos, passados seis anos do início da era flex, ainda deixam de lado esse recurso em larga escala, presente apenas em uma série especial do VW Polo. Alegam que a tecnologia precisaria “amadurecer”. Se o MMA fosse pragmático e menos focado na plateia, adotaria um ciclo de homologação de emissões mais rigoroso na fase fria, induzindo, em prazo negociado, o fim desse impasse que só traz prejuízo ao consumidor.

Alternativas para motos e caminhões

Motocicletas são veículos em que o custo/km muito baixo não atrairia tanto a tecnologia flex. Mas preocupações ambientais e oportunidade de mercado levaram a Honda a lançar a CG 150 Titan Mix, a primeira no mundo com essa característica. A Delphi também desenvolveu seu sistema flex e negocia com um possível cliente em Manaus (AME Amazonas), onde se localiza o polo produtor brasileiro de duas rodas.

Para simplificar e contornar a falta de espaço no quadro, a fabricante japonesa deixou de adotar qualquer sistema auxiliar de partida a frio, aproveitando a peculariedade no abastecimento, em geral supervisonada diretamente pelo próprio condutor. Há uma luz de aviso sobre a temperatura externa abaixo de 15° C. Uma vez acesa, o usuário deve acrescentar de 2 a 3 litros de gasolina (20% da capacidade do tanque), se for abastecer só com etanol. Uma maneira prática de aproveitar o preço competitivo do combustível renovável. Para quem roda muito é bastante conveniente.

A moto flexível representa, hoje, em torno de 15% das vendas da família CG, a de maior sucesso da Honda. A fábrica também foi a primeira, entre as quatro marcas japonesas que produzem automóveis e comerciais leves no País, a apostar nessa tecnologia, ao lançar o Civic em 2006.
Picapes médias também já estrearam o motor flexível. Primeiro modelo foi a Chevrolet S10, de quatro cilindros. A Mitsubishi desenvolveu o inédito motor V6 etanol (205 cv)/gasolina (200 cv), primeiramente para o utilitário Pajero Sport HPE e, no mês de outubro, o lançou na picape L200 Triton. Trata-se do mais potente motor flex disponível no mercado brasileiro, mas fabricado no Japão. As peças específicas são exportadas daqui, em desenvolvimento conjunto com a Magneti Marelli.

Quanto a caminhões, as aplicações ainda estão no campo de estudos, pois o ciclo Diesel se mostra o mais adequado às grandes cargas. Uma das soluções é o sistema bicombustível, com tanques separados para diesel e álcool. O uso de ambos administra-se por controle eletrônico de injeção, em volumes adaptáveis às necessidades de potência. Já se testou esse arranjo há três décadas, mas a injeção mecânica inviabilizava a experiência.

Outra solução, que a Scania aplica desde 1993 em ônibus na Suécia e testa atualmente em São Paulo, é a manutenção do ciclo Diesel e abastecimento único com etanol aditivado para aumentar seu índice de cetano. Em corredores exclusivos de ônibus e frotas cativas mostraria amplas vantagens ambientais.
Finalmente, a alternativa mais radical seria útil para usinas de etanol e fornecedores de cana-de-açúcar. Transformar o ciclo Diesel em Otto e abastecer caminhões, tratores, colheitadeiras e veículos de apoio apenas com etanol da própria fonte. Para uso próprio o combustível custa um terço do diesel. A FPT trabalha nessa solução, a pedido de algumas dessas empresas do agronegócio.

http://www.msnauto.com.br/

Texto: Fernando Calmon

Econews




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